Ensino de inglês como língua estrangeira para adultos: relatos

Ensino de inglês como língua estrangeira para adultos: relatos

por Isadora Matos

 

Minha formação, em andamento, como professora de língua inglesa é, em sua maioria, baseada no ensino de inglês como língua estrangeira para adultos. Tive poucos momentos em sala de aula com crianças, porém o meu envolvimento com o idioma, como estudante, ocorreu quando ainda estava na infância e adolescência. Os exemplos de professores e métodos de ensino que tinha, nos primeiros momentos da minha formação como professora, eram pensados para um público infanto-juvenil. Por isso, encontrei (e encontro) alguns desafios ao me deparar com uma turma para adultos.


A primeira turma que ensinei era formada por um grupo bem diversificado de alunos, com idades entre 16 e 50 anos – se não me falha a memória. Lembro que meu orientador me alertou para que não ficasse intimidada com alunos mais velhos que poderiam questionar o fato de estarem aprendendo uma segunda língua com alguém bem mais novo que eles – tinha 18 anos e tenho, até hoje, um rosto infantil. Durante as primeiras semanas de aula, em meio à correria de desenvolver um plano de aula – algo que nunca tinha feito na vida –, percebi que alguns alunos tinham mais dificuldades que outros. Era algo a se esperar numa sala de aula… O problema era que estes alunos, na sua maioria, eram mais velhos. De acordo com Ellis (apud SAPUCAIA, 2017),


 

é necessário investigar e fazer distinções entre o efeito da idade, no caminho da aquisição, (onde os itens da língua alvo são adquiridos na mesma ordem por diferentes alunos), a agilidade (quão rápido o aluno adquire a língua) e o desenvolvimento final/conclusivo (quão proficiente na língua o aluno estará no final do processo).


 

Assim ele conclui que a área mais afetada pela idade seria o nível de proficiência na segunda língua, isto é, na total fluência comunicativa do aluno, mas não necessariamente nas outras áreas como, aquisição e agilidade. Apesar de ser uma notícia desestimulante, algumas pesquisas indicam que a aprendizagem de uma nova língua retarda processos de demência comuns em idosos como alzheimer. Ou seja, protegemos nossos cérebros ao estudar uma nova língua. Alcançar o desenvolvimento final para os alunos mais velhos era mais trabalhoso, mas eu, como professora, não poderia desencorajá-los, já que os benefícios vão além de aprender uma língua nova.


Os diferentes ritmos de aprendizagem tornam-se mais nítidos entre alunos de diferentes idades, porém meu maior vilão foi (e é) a tradução. Sem divergência entre mais velhos ou mais novos, os alunos buscam, na tradução, um conforto para o choque que é entender o mundo de outra maneira. Para compreender o inglês, na maioria das vezes, meus alunos associavam-no ao português através da tradução de palavra por palavra. Alguns alunos ficam inconformados, quando demoro um bom tempo explicando algo na língua alvo ao invés de simplesmente traduzir ou quando ensino algo que é diferente do português e não sei explicar porque é diferente (“I’m 21”, not “I have 21”). Só percebi que isso é um problema muito maior nos adultos quando ensinei, pela primeira vez, para crianças do ensino fundamental I. Em nenhum momento, questionaram porque se fala “Ógust” e não “Augusti” ou porque usa-se o “do” para fazer perguntas no simple present. Com os meus poucos conhecimentos em Linguística Aplicada, creio que os alunos adultos são mais apegados aos padrões da língua portuguesa, enquanto para os alunos mais novos, por ainda estarem em processo de letramento na língua mãe, padrões diferentes não são tão desconfortáveis. Por isso, é muito mais difícil, para adultos, fazer construções com -‘s para indicar posse – que não tem no português –, ao invés de utilizar a preposição “of”, que se assemelha ao “de”. No entanto, é importante lembrar que esse mesmo fator pode auxiliar a aprendizagem ao invés de dificultar. Alguns alunos preferem e aprendem mais rápido quando reconhecem padrões gramaticais no português e sabem adaptá-los para a língua alvo. Em Linguística, isso está relacionado ao conceito de interlíngua, ou seja, um “sistema de transição criado pelo aprendiz, ao longo do seu processo de assimilação de uma língua estrangeira” (2017). No primeiro caso (-‘s ou “of”), as estruturas da língua materna interferem na produção na língua alvo, provocando desvios na pronúncia, vocabulário, estrutura das frases, assim como no âmbito idiomático. No segundo caso, quando a aprendizagem se beneficia através dos paralelos entre as línguas materna e alvo, é um exemplo de transferência, isto é, “o aproveitamento das habilidades linguísticas prévias no processo de assimilação de uma língua estrangeira” (2017).


Outro aspecto que precisei levar em consideração, ao ensinar para adultos, foi reconhecer que esses alunos possuem habilidades e conhecimentos na língua mãe e que pode ser bem frustrante reconhecer-se numa posição de desconforto, na qual não se pode aplicar todo esse conhecimento, como ao falar outra língua. Um dos meus alunos particulares, um advogado de 52 anos, comentou, em uma de nossas aulas, que o mais difícil, para ele, era não poder colocar em palavras tudo aquilo que ele realmente queria dizer. O processo para aprender uma nova língua o infantilizava. A partir daí, passei a procurar caminhos para respeitar o conhecimento de mundo que meus alunos já tinham para que eles se sentissem mais confiantes e envolvidos com a língua.


O constrangimento e as dificuldades causam, muitas vezes, as desistências. Porém, muitos deles retornam ao estudo para uma segunda, terceira, quarta tentativa. Já tive alunos que vieram conversar comigo, no final da primeira aula, para dizer que esse era o terceiro curso de inglês que elas(es) estavam fazendo ou que estavam repetindo o nível pela segunda ou terceira vez. Creio que muito desses alunos adquiriram um certo bloqueio com inglês, que é causado por diversos fatores (talvez alguns dos que já foram citados aqui). Ao longo desses três anos, tive duas alunas com essa característica. Uma delas desistiu do curso no meio do semestre (talvez pela minha ignorância, na época, de como lidar com casos como esse) e outra continuou e conseguiu um desempenho satisfatório ao fim do semestre. Acredito que um dos fatores que causam o bloqueio está associado à timidez, como foi o caso da segunda aluna que citei. É preciso reconhecer os estudantes e suas habilidades para que o planejamento das atividades alcance diversas formas de aprendizagem. Alguns alunos aprendem melhor ouvindo, outros lendo, enquanto outros preferem associar ao movimento corporal etc. Na minha pouca experiência, percebo que os alunos combinam essas habilidades, mas quase nunca são proficientes em todas elas. Ou seja, um bom plano de aula deve considerar o grupo de alunos e suas formas de aprendizagem. Minha aluna tímida fez amizade com mais dois alunos na sala e, nesse pequeno círculo social, conseguia desenvolver as atividades bem melhor do que em grupos maiores como a sala toda. Coube a mim, como professora, pensar em atividades alternativas para que ela pudesse alcançar os mesmos objetivos dos outros alunos.


Poderia citar outros desafios de ensinar inglês para adultos e, junto a eles, formas que encontrei para superá-los, mas acredito que esse não seja o objetivo do meu texto. O que propus foi, a partir da minha experiência, que os professores de língua estrangeira pensem no público-alvo que ensinam e como tornar a aula mais propícia para atender as necessidades dos alunos. Isso não vale só para adultos, mas para qualquer sala de aula. Muitas vezes, adaptações serão necessárias e precisamos estar dispostos para encará-las.


 

REFERÊNCIAS

 

SAPUCAIA, Michele. Aquisição e aprendizado: dois processos no ensino de uma segunda língua. Disponível em: <http://www.mackenzie.com.br/fileadmin/Graduacao/CCL/projeto_todasasletras/inicie/MicheleSapucaia.pdf>. Acesso em: 06 jun. 2017.

 

SEM AUTOR. Interferência, interlíngua e fossilização. Disponível em: <http://www.sk.com.br/sk-interfoss.html>. Acesso em: 04 jun. 2017.

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