Ari Sacramento: um intelectual-Sankofa


Lívia Natália[1]

Um caracol, sobre-si dobrado, que olha pra trás e pra frente. Aquele contemporâneo de costas quebradas a reinventar no Tempo, saberes e saberes no Tempo. Há mesmo corpos que não contam, há corpos que se contam no breu das desimportâncias, e o rotundo corpo do Prof. Dr. Ari Sacramento não contaria, não fosse a sua envergadura filosófica que se pensa e que nos faz pensar não sobre ele, mas sobre corpos que, no dele, gritam pelos alvacentos corredores da Universidade.
Como intelectual negro, Ari Sacramento sabe da produção de lugares de exclusão, marginalidade e violência simbólica e material que tentam, cotidianamente, marcar seu corpo e alquebrar seu espírito, e usa do seu lugar de fala como curva epistemológica, como eixo de ruptura, enegrescendo o seu campo de saber.
Entre os anos de 2005 e 2014, Ari Sacramento constrói o percurso que o leva de um brilhante pesquisador e recém-graduado na área de Filologia no Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia (ILUFBA) para um doutor na área com a provocadora tese Nas tramas de Greta Garbo, quem diria, acabou no Irajá: crítica filológica e estudo de sexualidades. Em 2009, após concurso, entra para o quadro de professores efetivos do ILUFBA no Setor de Filologia e este seu eterno gesto de refletir se espraia pelas suas aulas, orientações e publicações de maneira cada vez mais vigorosa.
Ari Sacramento é aquilo que chamo de intelectual-sankofa pelo seu compromisso em incluir-se na cena de estudo indo muito além do exercício da mera vaidade, mas fazendo o seu corpo de homem gay, negro e periférico ser levado em conta em cada análise que se ergue de suas mãos muito vivas, na escolha dos textos lidos com afinco e brilhantismo, na formulação dos planos de disciplina únicos e na sua atuação e auto-inscrição mordaz, porém sensível, tornando a sua aparição um acontecimento único no mundo acadêmico.

[1] Associada de Teoria da Literatura. Tutora do PET Letras UFBA. 

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