A toponímia na América Latina: como nomear um país?

O estudo dos nomes próprios é considerado um dos elementos fundamentais para se conhecer um pouco mais sobre um povo, como os seus registros, sua cultura, sua organização em sociedade, suas crenças etc. O ato de nomear corresponde a uma prática antiquíssima, até porque seria extremamente laborioso conceber uma sociedade que não atribua vocábulos designativos a pessoas, animais, lugares e até mesmo a alguns objetos. A ciência linguística que se dedica ao estudo dos nomes próprios é a onomástica que, por sua vez, subdivide-se em diversas subáreas de estudo. Podemos determinar duas subáreas principais: a antroponímia e a toponímia. A antroponímia dedica-se ao estudo dos nomes próprios de pessoas, seja ele do nome completo (prenome e sobrenome), seja ele de suas partes. Já a toponímia refere-se ao estudo dos nomes de lugares, ambas considerando origem, forma e evolução.
Especificamente neste texto, vamos deter-nos aos topônimos da América Latina, tentando remontar, a partir do Dicionário etimológico da língua portuguesa - Tomo II, de Antenor Nascentes (1952), algumas informações sobre como se deu o processo de nomeação dos países que a compõe. Para isso, torna-se necessário, a título de exórdio, compreender o que é como se constitui a América Latina.
Como o próprio nome sugere, a América Latina é uma região do continente americano que engloba os países que falam as línguas românicas (que tem o latim como principal fator de formação), como o português, o espanhol e o francês. Territorialmente, compreende quase toda a América do Sul e Central, mais especificamente: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela (exceto pela Guiana, pelo Suriname e pelo Belize, que são países de língua germânica). O México, localizado na América do Norte, também a integra.
Falaremos agora sobre a tentativa que aqui fizemos de recuperar a origem dos nomes dos países já mencionados acima. Começando pelo nosso país, acreditamos que muitos já conhecem um pouco da história do nome “Brasil”. A explicação geral que se dá é que este nome vem da palavra “pau-brasil”, madeira utilizada para tinturar tecidos devido a sua coloração vermelha e que foi um grande item “econômico” da época. Porém, sabemos que essa explicação não é tão simples e é também muito mais antiga. Cabe ressaltarmos que antes de tal designação, as terras descobertas pelos portugueses, em 22 de abril de 1500, também foram designadas de Pindorama (nome dado pelos indígenas que aqui viviam, com o significado de “terra das palmeiras”), Monte Pascoal (devido ao aspecto do primeiro ponto de terra avistado, além do período em que isso ocorreu, época da Páscoa), Ilha de Vera Cruz e Terra de Santa Cruz (a mudança de “Terra” por “Ilha” se deu quando os portugueses perceberam a grande extensão territorial).
Para os nossos hermanos argentinos, o nome se deu devido à grande riqueza de minérios encontrada em suas terras, principalmente a prata. Daí o nome “Argentina”, de argentum. A Colômbia recebeu este nome em uma óbvia homenagem a Cristóvão Colombo que, em 1492, tomou posse do continente americano. Em outro viés de homenagens, está a Bolívia, que recebeu este nome devido ao general Simon Bolívar, um dos principais heróis da luta pela independência deste país. Nicarágua é o resultado da união do nome Nicarao unido ao elemento agua, que significa “água de Nicarau”, nome de um cacique que se submeteu ao conquistador Gil Gonçalves, em 1522. A Venezuela é assim chamada por ideia de Hojeda que, ao ver o lugar construído sob palafitas, lembrou da paisagem de Veneza, sendo “Venezuela” o diminutivo.
Segundo Nascentes (1952), várias são as hipóteses para a escolha do nome “Chile”. Uma delas é a de que seu uso foi pensado por uma característica geográfica, pois se diz que, na língua dos índios aimarás, a palavra chilli quer dizer “confins do mundo”, posto que este país se encontra no extremo oeste do continente. Porém, também se considera a palavra chili, do antigo quíchua, que significa “frio”. É também o nome de um rio chileno, não podendo definir claramente se o nome do país passou ao rio ou o nome do rio passou ao país. O Suriname recebeu este nome devido aos seus habitantes, os índios surinen. Já para “Paraguai”, Nascentes (1952) não está totalmente seguro em afirmar sua origem. Há algumas elucubrações que apontam que esta designação venha dos índios que habitavam a margem do rio, os paiaguá, com “Paraguai” significando “rio dos paiaguás”. Outras propostas admitem que signifique “rio das palmeiras”, devido aos grandes bosques que cobriam as margens dos rios. Também há a possibilidade de se tratar do “rio dos papagaios”.
Já o Uruguai recebeu este nome devido ao grande rio que o atravessa com a palavra “Uruguai”, no idioma dos índios que ali habitavam, significando “rio dos búzios/caracóis”. O Equador recebeu este nome em referência à linha equinocial que o atravessa, promovendo a divisão do planeta Terra em hemisférios Norte e Sul. Uma das origens mais propugnadas para o nome “Guiana”, segundo Nascentes (1952), é também oriunda de sua localização geográfica, cercada de muitos rios, como o Amazonas e o Negro, além do Oceano Atlântico que a banha. Do tupi, wayana significaria “rio”, com o significado de Guiana remetendo a “país dos rios”. No caso do Peru, a origem do nome desse país não é exata, mas Nascentes (1952) diz que pode se tratar da derivação do nome Biru, importante chefe índio. El Salvador seria uma clara referência a “o salvador”, Jesus.
Guatemala viria da palavra indígena Quauhtematlan, que significa “lugar dos montões de terra”, devido às lautas florestas que lá existiam antes da colonização espanhola. Haiti é uma palavra interpretada como “terra áspera” ou “monte (ahiti), montanhoso (aiti)”. Honduras é um nome oriundo de uma palavra espanhola, hondura, que significa “fundura”, como referência às águas profundas e difíceis de aportar presentes no litoral norte do país. Panamá tomou o nome de uma aldeia, significando algo como “muito peixe”. Para República Dominicana tem-se a origem do segundo termo do nome “Santo Domingo”, principal cidade e capital do país, que recebeu seu nome em homenagem ao santo espanhol São Domingo de Gusmão, o fundador da Ordem Dominicana. Costa Rica vem da palavra “costa” (de mar) e do adjetivo “rico”, nome dado por Alvarado, seu conquistador, por causa dos múltiplos tesouros encontrados em suas terras (e do tão ambicionado ouro). México, do nauatle Mexitli, cognome de Uitzilopotxtli, deus da guerra, e co, significando “em, junto”. Por fim, a origem do nome “Cuba” é praticamente desconhecida, mas há uma especulação em Nascentes (1952) sobre ser originária do nome de uma cidade indígena.
Outrossim, o objetivo deste compilado de informações reunidas neste texto é, posto que a onomástica seja uma área de estudo fortemente ligada aos aspectos sócio-históricos e culturais de um povo, tentar entender um pouco das idiossincrasias de cada lugar, com línguas e costumes diferentes, porém reunidos sob o mesmo título: latino-americanos. Conhecer e apresentar um pouco das origens históricas de cada região é uma das formas de nos aproximarmos enquanto povo único, de tantas histórias e tanta importância no cenário mundial. Pudemos notar, em muitos casos, como aspectos da colonização influenciaram diretamente não só na nomeação de cada país, mas também nos reflexos que ainda hodiernamente carregam no modo como vivem seus habitantes.
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