Templo das Sombras

É comum entre as bandas de heavy metal a produção de CDs conceituais, discos que falam sobre um só tema ou que narram alguma história. Em 2005, a banda de heavy metal paulistana Angra lançou o Temple of Shadows, quinto álbum de estúdio, que narra a história de The Shadow Hunter (o Caçador de Sombra), um cavaleiro que se junta ao exército convocado pelo Papa para participar da primeira cruzada (1096-1099) e, segundo a profecia de um rabino, seria convocado por Deus para espalhar seu fogo. Ao longo de sua jornada, o cavaleiro vivencia vários conflitos que o fazem refletir sobre a Guerra Santa da qual participa e os ideais da igreja católica, colocando sua devoção à prova. Quando aceita seu destino, o cavaleiro parte em uma peregrinação para difundir uma nova crença que prega apenas palavras de amor e paz, contradizendo vários ensinamentos da igreja, que o define como herege. Para se descobrir o que acontece depois é preciso escutar o disco e ler o seu encarte, que é apresentado em formato de livreto, no qual antes da letra de cada canção existem um ou mais parágrafos que narram os acontecimentos que as antecedem.


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Rafael Bittencourt, um dos guitarristas da banda, cofundador do Angra e frontman do grupo, é o dono da mente que concebeu a história contada no disco, produto de um trabalho galgado em duas vertentes artísticas: a música e a literatura. Por que galgado na música é evidente, não há necessidade de discussão, mas por que galgado na literatura, é preciso pensar. Para que o ouvinte seja imerso na história narrada e depreenda todo o seu conteúdo, ele precisa ler os capítulos que antecedem as letras das canções. Mais do que isso, há de se levar em consideração as palavras de alguns estudiosos e conhecedores da questão.




A Literatura, como toda arte, é uma transfiguração do real, é a realidade recriada através do espírito do artista e retransmitida através da língua para as formas [...] e com os quais ela toma corpo e nova realidade. Passa, então, a viver outra vida, autônoma, independente do autor e da experiência de realidade de onde proveio. (COUTINHO, Afrânio, 1978, p. 9-10).



Bittencourt, o artista que idealizou a obra, transmite, através da palavra e da música, a história que ganha vida própria no disco e se destaca de maneira discrepante do restante da discografia da banda. O disco imita a vida e eventos marcados na história, ainda que ornado com elementos outros que enriqueçam a narrativa, assim como disse Aristóteles, a “Arte Literária é mimese (imitação); é a arte que imita pela palavra”.


por João Vítor Madureira

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