Mural - Cem Anos de Solidão
Julho de 2013 - Cem Anos de Solidão
A partir do projeto Oficinas de Ler e Pensar, realizado em conjunto com o PET-Filosofia, que visa discutir, com um olhar não acadêmico, questões literárias e filosóficas em obras consagradas da literatura, no mês de Julho foi montado o mural do PET-Letras baseado no livro Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Márquez. No mural de Julho falamos da vida do autor, discutimos coisas como o realismo fantástico, o porquê de ler a obra, os personagens, dentre outros.
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Biografia
Jane Almeida, Lucas Silva & Paula Oliveira
“É necessário abrir os olhos e perceber que as coisas boas estão dentro de nós, onde os sentimentos não precisam de motivos nem os desejos de razão. O importante é aproveitar o momento e aprender sua duração, pois a vida está nos olhos de quem saber ver.”
Gabriel Garcia Márquez
Famoso escritor colombiano, também jornalista, editor e militante político, apelidado pelos amigos de Gabito (Gabo), nasceu em 6 de março de 1928, na cidade de Aracataca, na Colômbia. Autor do celebre livro “Cem Anos de Solidão”, publicado em 1967. Recebeu o prêmio Nobel de Literatura, em 1982, pelo conjunto de sua obra literária. Em 1962, ganhou também o prêmio Esso de Romance, na Colômbia, com o romance “O Veneno da Madrugada”. Como jornalista passou por vários jornais, sendo correspondente internacional na Europa e em Nova York, onde foi perseguido pela CIA, devido a sua amizade com Fidel Castro. Exilou-se no México, onde escreveu a maioria de suas obras.
Márquez foi criado com seus avós, em Aracataca, enquanto isso a sua família vivia em Barranquilla. Seus avós maternos, foram fundamentais para o futuro escritor, que se inspiraria nestas figuras – o avô, Nicolás Márquez, veterano da Guerra dos Mil Dias, travada entre liberais e conservadores colombianos; a avó, Tranquilina Iguarán – para criar seus personagens, principalmente os que povoam as páginas de seu clássico Cem Anos de Solidão. Ele cresce apaixonado pela literatura, principalmente pelas histórias de As Mil e Uma Noites e pelo irrealismo de Kafka em A Metamorfose. Completou os primeiros estudos em Barranquilla e Zipaquirá, onde um professor de literatura, Carlos Julia Calderón Hermida, teve um papel fundamental na sua formação como escritor, mais tarde Márquez dedicaria a ele seu romance O Enterro do Diabo (1955). Por insistência dos pais, Márquez chegou a iniciar o curso de direito na Universidade Nacional, em Bogotá, mas logo mudou para jornalismo, mesmo assim nunca terminou o curso.
No México inicia a sua carreira literária, no princípio escrevendo roteiros cinematográficos. Sua Primeira Obra é La Hojarasca, publicada em 1955.
Em 1967 publica, Cem Anos de Solidão, considerado um grande marco da literatura latino-americana, obra que tem a peculiaridade de ser umas das mais lidas e traduzidas de todo o mundo. O livro narra a história da família Buendía, na cidade fictícia de Macondo, e contempla o gênero da narrativa fantástica.
Em 2002, Márquez lança Viver para Contar, uma autobiografia que ele escreve logo após ser diagnosticado com câncer linfático. Até então ele vem se tratando na ilha de Cuba, onde em 2009, declarou encerrada a sua careira literária.
Suas principais obras:
- Relato de um náufrago - 1955
- Ninguém escreve ao coronel - 1961
- Cem anos de solidão - 1967
- A última viagem do navio fantasma - 1968
- Um senhor muito velho com umas asas enormes
- Crônica de uma morte anunciada -1981
- O verão feliz da senhora Forbes
- O Amor nos tempos da cólera - 1985
- O general em seu labirinto
- Doze contos peregrinos - 1992
- Do amor e outros demônios 1994
- Olhos de cão azul
- O outono do Patriarca
- Entre amigos.
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Afinal, o que é o realismo fantástico?
Larissa Nakamura & João Vitor Madureira
Surgido em meados do século XX, o Realismo Fantástico é considerado uma resposta latino-americana à literatura fantástica europeia buscando-se sua autonomia literária e maior projeção/inserção no mundo artístico. Essa resposta se deu por conta do momento político que grande parte da América Latina vivia na década de 60, as ditaduras, os golpes, as revoluções políticas como, por exemplo, a Revolução Cubana. Nesse momento, muitos escritores participavam ativamente dos movimentos políticos e sociais e abordavam esses temas em suas obras. A partir de então, buscou-se uma espécie de reescritura da história latino-americana, na qual tira-se da mão dos europeus a autoria da construção das nações americanas e se faz duras críticas ao momento político desses países. Em um contexto de forte repressão,os autores não tiveram saída senão publicar suas obras no exterior, muitos deles no exílio, começando por editoras de Barcelona, na Espanha, restante da Europa e também nos Estados Unidos. Esse momento ficou conhecido como o boom da literatura latino-americana, pois as vendas e a disseminação desses livros estouraram e se espalharam pelo mundo.
Com o compromisso estético e político, tratamento da linguagem, mostrando a constante exploração e realidade social da América Latina, o Realismo Fantástico tem como características principais elementos mágicos, fantásticos e/ou sobrenaturais que são incorporados à normalidade dos personagens, tem a sinestesia como percepção da realidade (cheiros, cores e sons), o tempo é anacrônico, porém cíclico, distorcido para que as linhas do tempo se repitam ou se pareçam com o passado.
Um bom exemplo de utilização do realismo fantástico em terras tupiniquins é a telenovela Saramandaia. Dias Gomes, o autor da primeira versão da novela (de 1973) afirma em sua autobiografia, “Apenas um Subversivo”, que a novela tinha o propósito de driblar a censura vivida pelo Brasil àquela época e experimentar uma linguagem nova na televisão, com metáforas e símbolos. Algumas coisas passavam, outras não, o que acarretou em alguns cortes em sua exibição.
Em Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez, elementos que constroem o realismo fantástico podem ser encontrados ao longo da obra, como o nascimento de uma criança com rabo de porco, a estranha presença de borboletas amarelas que seguem o personagem Maurício Babilônia, a presença constante de fantasmas, a fertilidade dos animais relacionados ao relacionamento amoroso entre Petra Cotes e Aureliano Segundo, a existência de uma cruz de cinzas que não se apaga na testa dos 17 filhos do coronel Aureliano Buendía, entre outros.
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Porque ler Cem anos de Solidão?
Carolina Peixinho Miranda Gonçalves
Enumerar os possíveis motivos que tornam Cem anos de Solidão uma leitura mais do que indispensável seria conveniente, porém mais do que a quantidade de motivos o que realmente importa é a relevância de tais motivações. Cem anos de Solidão, obra do renomado Gabriel García Márquez é escrita na década de 60 e publicada em 1967, narrativa do gênero realismo fantástico conta a história dos Buendía, fundadores da mítica cidade de Macondo, condenados a solidão.
Dentre as motivações, é sabido que a obra ganhou o prêmio Nobel de Literatura em 1982, já foi traduzido para mais de 30 línguas e possui excelente recepção crítica. Sua repercussão começa com sua publicação, e há quase 50 anos ainda ocupa lugar de destaque nas estantes das principais livrarias em todo o mundo. O lançamento da obra transpassa pelo chamado “boom” da literatura latino-americana e traz contextualizações do período histórico que a América Latina vivia.
Embora estes sejam motivos relevantes para justificar sua leitura, debruçar-se sobre Cem anos de Solidão é ainda encarar a mescla de revoluções, fantasmas, incesto, corrupção, fascínio, misticismo, crendices e loucura. É conhecer uma literatura do realismo fantástico que contracena com estratégias de repetição e catástrofe. É perceber que a concepção do tempo na obra é cíclica sem deixar de ser surpreendente. É notar a existência da representação da criação, pois nela não só passa a criação da família, a chegada das instituições, dos poderes como isso se dá em similaridade com aspectos semelhantes aos clássicos e textos bíblicos. É não menos importante reconhecer que Macondo funciona como uma alegoria da América Latina explorada e concebida dentro dos motes europeus. Pois como o próprio Gabo diz no discurso de agradecimento a Academia de Letras da Suécia em sua premiação: “A América Latina não quer nem tem por que ser um peão sem rumo ou decisão, nem tem nada de quimérico que seus desígnios de independência e originalidade se convertam em uma aspiração ocidental.”
Sendo assim, Cem anos de Solidão contempla todos os argumentos que justifiquem e induzam a leitura de sua obra, ainda que a estética possa alcançar cada leitor de maneira particular.
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De Comala a Macondo
Filipe Castro& Priscila Machado
Juan Rulfo, escritor mexicano, nascido em 16 de maio de 1917, em Sayula, foi um dos grandes expoentes da literatura hispano–americana. Marcou não somente com a densidade dos seus escritos, mas também deixou os primeiros traços do que entendemos como realismo mágico ou realismo fantástico, estilo desenvolvido por outros admiradores de Rulfo, como Márquez, Borges, Cortázar, e posteriormente, por autores como Mia Couto.
Pedro Páramo, o único romance do escritor, é considerado a obra mais influente da literatura hispano-americana. Foi publicado em 1955, depois de ter lançado seu livro de contos: El llano em llamas, traduzido para o português como Chão em Chamas.
Abaixo segue um trecho de um texto escrito pelo escritor colombiano, Gabriel Garcia Márquez, após ter lido Juan Rulfo:
“(...) o escrutínio a fundo da obra de Juan Rulfo me deu, por fim, o caminho que procurava para continuar os meus livros e que, por isso, me era impossível escrever sobre ele sem que tudo isto parecesse ser sobre mim próprio. Agora também quero dizer que voltei a ler toda a sua obra para escrever estas breves nostalgias e que voltei a ser a vítima inocente do mesmo assombro da primeira vez. Não são mais de 300 páginas, mas são quase tantas, e creio que tão perduráveis como aquelas que conhecemos de Sófocles.” (MÁRQUEZ, 2003)
Após ler “Cem anos de solidão”, e em seguida, “Pedro Páramo”, fica clara a grande relação entre os dois. O lugar mágico, Macondo (lugar literário das histórias de Márquez), é também o lugar do esquecimento, lugar onde a memória se perde, onde o corpo se transforma, resiste e as relações se fundem. “Pedro Páramo” conta a história de Juan Preciado, que, após a morte de sua mãe, decide ir à Comala (lugar literário das histórias de Rulfo) em busca do seu pai, Pedro Páramo.
Logo na primeira página do livro, temos um trecho que marca o desenvolvimento da história. A mãe, no leito da morte, diz para o filho:“- Não peça nada a ele. Exige o que é nosso. O que ele tinha de ter me dado e não me deu nunca... O esquecimento em que nos deixou, filho, você deve cobrar caro. (RULFO, p.15)”
Ainda na primeira página faz-se referência a Comala como esquecimento, e a memória, como algo que precisa ser refeito todos os dias. Os cem anos solidão, em Macondo, refletem muito do que acontece em Comala. As personagens parecem estar fundidas com o espaço. Tudo que acontece em Macondo acaba refletindo no corpo e na vida delas. Mesmo com muitas pessoas ao redor, cada personagem possui sua mania, sua solidão. Rebeca, a menina que comia terra, Aureliano e os peixinhos de ouro, José Arcádio e a sede pela ciência etc. Em Comala, as personagens são secas como a terra. Juan Preciado encontra defuntos ao longo de seu caminho, que vão construindo a memória do seu pai, a quem procura. A tristeza sempre aparece marcada como algo íntimo e necessário à sobrevivência, como uma sombra que acompanha a existência e as lembranças.
Outra relação forte entre “Cem anos de Solidão” e “ Pedro Páramo” é o ritmo das narrativas, que é estruturado segundo o estilo das narrativas orais: com muita fluidez e a ideia de que a história a ser contada, em si, parece ser mais importante que uma possível descrição de personagens, situações, cenários e etc., mesmo que ela seja, no caso das personagens, de cunho psicológico, como acontece, por exemplo, na literatura realista do séc XIX.
Em “Pedro Páramo”, essa característica pode ser percebida em toda obra, e já é sinalizada por Octávio Paz no prólogo do livro, quando diz que:
“(...)Todas as palavras que estamos a ponto de escutar, mais que ler, provêm, pois, dos lábios de um morto.”
Os dois romances utilizam a não linearidade e o clímax acontece a todo momento de forma intensa. A mirada ao passado, a busca por reconstruir a memória, é algo latente nas duas obras. Desse modo, podemos facilmente comparar Macondo a Comala, seja na imagem plasmada da guerra, do esquecimento e, não esquecendo a cosmogonia que emerge das duas histórias.
È axiomático, após ter lido Pedro Páramo, não estabelecer uma ponte com Cem anos de solidão. Contudo, Márquez consegue manter seu estilo, sua linguagem intrigante, embebido por mitologias e realismo fantástico, que marcam a história da literatura hispano-americana.
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Antropônimos em Cem Anos de Solidão
Letícia Rodrigues
“Na longa história da família, a tenaz repetição dos nomes tinha permitido que ela [Úrsula] chegasse a conclusões que lhe pareciam definitivas. Enquanto os Aurelianos eram retraídos, mas de mentalidade lúcida, os José Arcádio eram impulsivos e empreendedores, mas estavam marcados por um destino trágico.”
Essa passagem do livro é apenas uma confirmação do que já é percebido no decorrer da leitura. A escolha dos nomes em Cem Anos de Solidão, feita por Gabriel García Márquez, não foi aleatória e atribui algumas características aos personagens. Outra contribuição importante referente à escolha dos nomes é a sensação de tempo cíclico que a repetição transfere, como se os descendentes fossem um reflexo dos personagens que já existiam. A seguir uma pequena lista dos significados de alguns nomes:
Melquíades: Foi um dos primeiros personagens a figurarem a obra. Seu nome pode ser associado ao de um famoso general ateniense relacionando-se a certa forma de comando que este cigano exercia no patriarca da família Buendía através dos objetos inovadores que apresentou a ele.
Pilar: Palavra com origem no latim pila que significa pilar ou fonte. Invocação aragonesa da Virgem Maria, que, segundo a tradição, teria aparecido ao apóstolo Santiago sobre um pilar de mármore às margens do rio Ebro.
Mauricio:"aquele que tem pele escura".
Rebeca: Considerada uma mulher de muita beleza.
Rebeca, ao contrário do que se pôde esperar, era a mais bela.Tinha uma pele diáfana, olhos grandes e repousados, e umas mãos mágicas que pareciam elaborar com fios invisíveis a trama do bordado. Amaranta, a menor era um pouco sem graça, mas tinha a distinção natural, a altivez interior da avó morta.
Fernanda: Significa audaz ou empreendedora. Tem na ousadia um dos seus atributos mais marcantes. Normalmente consegue aquilo que quer, ainda que nem sempre tenha noção das consequências desse sucesso. É uma batalhadora incansável e leva até o fim tudo o que começa e quase sempre consegue resultados positivos. A criatividade e o amor à liberdade são outras das suas características mais marcantes. Apaixonada, se sujeita a muitos dissabores no campo sentimental, causado pelo seu romantismo.
Aureliano: Filho do ouro. No livro, essa ligação aparece muito na criação dos peixinhos de ouro.
Arcadio: Vindo da Arcádia. É importante ressaltar que naquela região mitológica viviam cantores e pastores de simplicidade e singeleza do contato mediato com as manifestações da natureza.
José: Faz referência à figura bíblica do grande construtor, tanto com relação à família como com trabalhos manuais.
Úrsula: Significa "pequena ursa" e é um nome com origem no latim.
Remédios: Pessoa intuitiva, com forte tendência mística.
Renata: Nome com origem no latim significa renascida, ressuscitada, nascida pela segunda vez. No livro é chamada de Renata Remédios e poderia ser encarada como a volta da primeira Remédios (esposa de Aureliano que morreu muito jovem).
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José Arcadio Buendía & Úrsula Iguarán
Letícia Rodrigues
Uniram-se quando Úrsula tinha 19 anos e fundaram a cidade de Macondo. Como diz o autor “[...] estavam ligados até a morte por um vínculo mais sólido que o amor: uma dor comum de consciência. Eram primos entre si.” A relação de parentesco sempre despertou o medo do nascimento de filhos com rabos de porco, como um caso que aconteceu com os seus tios. Para José Arcadio Buendía não era problema: “Não me importa ter leitõezinhos, desde que possam falar”. Assim, foi uma grande felicidade, principalmente para Úrsula, o nascimento de José Arcadio, Aureliano e Amaranta com todas as suas “partes humanas”.
José Arcadio Buendía era um homem visionário. No momento inicial da narrativa, aparecia estritamente dedicado à cidade e à família. Entretanto, isso muda ao conhecer Melquíades, um cigano, que o apresentou às novidades surgidas em outras regiões. Logo começou a desejar o conhecimento cada vez mais se interessando pelo imã, pelo gelo, pela alquimia etc. Por isso, montou um laboratório em sua própria casa ao qual dedicava a maior parte do seu tempo. Ao decorrer da narrativa, percebe-se uma diminuição da participação do patriarca na família, diferentemente de Úrsula que sempre acompanhou de perto todas as gerações do livro. A preocupação com as reformas na casa e na cidade, o sustento do lar pela produção dos animais de caramelo e o cuidado para que não houvessem relações entre parentes a fim de evitar o rabo de porco, por exemplo, partiram de Úrsula, pois a essa altura José Arcadio Buendía se dedicava somente à alquimia.
José Arcadio Buendía passou os longos meses de chuva fechado num quartinho que construíra no fundo da casa, para que ninguém perturbasse as suas experiências. Tendo abandonado completamente as obrigações domésticas, permaneceu noites inteiras no quintal, vigiando o movimento dos astros, e quase sofreu uma insolação, por tentar estabelecer um método exato para determinar o meio dia. [...] Foi por essa ocasião que adquiriu o hábito de falar sozinho, passeando pela casa sem se incomodar com ninguém, enquanto Úrsula e as crianças suavam em bicas na horta cuidando da banana e da taioba, do aipim e do inhame, do cará e da berinjela.
É Úrsula Iguarán que observa a repetição de características, geração a geração, através dos nomes. Assim como os José Arcadio possuíam personalidade mais sociável e impulsiva, os Aurelianos eram mais introspectivos, estudiosos e inteligentes cabendo a eles o interesse pelos manuscritos de Melquíades. O único caso em que as personalidades são contrárias é o caso dos gêmeos Aureliano Segundo e José Arcadio Segundo, mas ainda assim, no livro aparecem vários indícios que eles mesmos teriam trocado os seus nomes em uma brincadeira na adolescência e foram destrocados somente após a morte.
Talvez a maior ironia do livro seja que, alguns anos após a morte de sua matriarca (que viveu entre 115 e 122 anos) a família desapareça justamente com a morte do menino que nasceu com rabo de porco por ser filho de uma tia com seu sobrinho. Era como se a firme vigilância de Úrsula fosse o motivo da continuação da família. Além disso, é possível perceber que a prosperidade da casa e da cidade andava lado a lado, portanto, atribuindo boa parte dos méritos à principal mantedora do lar. Ela compreende com paciência as idéias inovadoras do marido, vive a fuga do seu filho José Arcadio, apóia Aureliano mesmo quando este passa muitos anos distante por causa da guerra e volta quase como um morto, além de ajudar a criar todas as crianças, trabalhar e cuidar da casa mesmo quando fica cega.
Ativa, miúda, severa, aquela mulher de nervos inquebrantáveis, a quem em nenhum momento da vida se ouviu cantar, parecia estar em todas as partes desde o amanhecer até a noite já bem avançada, sempre perseguida pelo suave sussurro das suas anáguas de cambraia. Graças a ela, o chão de terra batida, os muros de barro sem caiação, os rústicos móveis de madeira construídos por eles mesmos estavam sempre limpos, e as velhas arcas onde se guardava a roupa exalavam um cheiro tênue de manjericão.
Enquanto isso, José Arcadio Buendía possui uma passagem bem mais breve que se resumiu basicamente a dois momentos: o da sede de conhecimento e o da loucura. A morte de Melquíades e a aparição de outros fantasmas do passado contribuíram para a perda da razão do personagem que foi amarrado a uma árvore onde ficou até seus últimos dias de vida. Uma das passagens mais bonitas em Cem Anos de Solidão é o momento de sua morte:
Então entraram no quarto de José Arcadio Buendía, sacudiram-no com toda a força, gritaram-lhe ao ouvido, puseram um espelho diante das fossas nasais, mas não puderam despertá-lo. Pouco depois, quando o caripinteiro tomava as medidas para o ataúde, viram pela janela que estava caindo uma chuvinha de minúsculas flores amarelas. Caíram por toda a noite sobre o povoado, numa tempestade silenciosa, e cobriram os tetos e taparam as portas, e sufocaram os animais que dormiam ao relento. Tantas flores caíram do céu que as ruas amanheceram atapetadas por uma colcha compacta, e eles tiveram que abrir caminho com pás e ancinhos para que o enterro pudesse passar.
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Aureliano (O Primeiro) & Amaranta
Jane Keli Almeida
Segundo filho de José Arcádio Buendía e Úrsula. É batizado com o nome do avô (Pai de José Arcádio). Foi o primeiro ser humano que nasceu em Macondo. Quando, ainda, estava no ventre de sua mãe, Aureliano chorou e nasceu com os olhos abertos. Era silencioso, retraído, corajoso, curioso, tinha um olhar, extremamente, penetrante.
Úrsula não tornou a se lembrar da intensidade desse olhar até o dia em que o pequeno Aureliano, na idade de três anos, entrou na cozinha no momento em que ela retirava do fogão e punha na mesa uma panela de caldo fervente. O garoto, perplexo na porta, disse: “Vai cair”. A panela estava posta bem no centro da mesa, mas, logo que o menino deu o aviso, iniciou um movimento irrevogável para a borda, como impulsionada por um dinamismo interior, e se espedaçou no chão (...)
Aureliano dedicou-se a trabalhar na oficina de ourives, tornando-se um rapaz caseiro, preocupado apenas com o trabalho. Quando se tornou homem feito com o seu bigode negro de pontas engomadas e sua voz retumbante que haveria de caracterizá-lo na guerra, conhece Remédios Moscote e se apaixona. Apesar da grande diferença de idade, eles se casam. Mais tarde, Remédios morre vítima de um envenenamento. Aureliano envolve-se com a política ao tentar impedir o Sr. Apolinar Moscote de pintar todas as casas de azul a mando do governo. Tempos depois, torna-se o Coronel Aureliano Buendía, ao participar da guerra ao lado dos liberais. Morre sozinho, em casa muitos anos depois, fazendo peixinhos de ouro.
AMARANTA
Terceira filha de José Arcádio Buendía e Úrsula. Era pequena, um pouco sem graça, mas tinha a altivez da avó morta. Amaranta disputa o coração de Pietro Crespi com Rebeca, sua irmã de criação. Porém é Rebeca que fica noiva de Crespi, enquanto Amaranta morre de ciúmes e inveja. O tempo passa, e o casamento não acontece sempre adiado por alguma eventualidade, para felicidade de Amaranta e tristeza de Rebeca. Cansada de tanto esperar, Rebeca termina o noivado e se casa com seu irmão de criação José Arcadio. Abandonado por sua noiva, Pietro Crespi procura Amaranta para tentar dar uma nova chance para o seu coração destruído. Acaba se apaixonando por ela, que mesmo apaixonada, não lhe dar qualquer esperança. Frustrado e desesperado com a situação, Pietro Crespi comete suicídio. Amaranta queima a sua mão no fogão como forma de se punir pela morte do seu amado.
Tempos depois, Amaranta tem uma relação amorosa com Aureliano José, seu sobrinho (filho do Coronel Aureliano com Pilar Ternera). Depois, conhece o Coronel Gerineldo Márquez com quem mantém uma sincera amizade que acaba virando amor. Mas, Amaranta não aceita esse sentimento, prefere ficar sozinha na sua solidão. Quando envelhece, começa a fazer a sua própria mortalha, diz saber o dia e a hora que a sua morte chegará. Resolve, então, ser o correio da morte, levando cartas de pessoas de Macondo para os mortos. Morre virgem, velha, com a atadura na mão queimada que ela carregou por boa parte da sua vida.
Atraído pelas vozes públicas de que Amaranta Buendia estava recebendo cartas para os mortos, o Padre Antonio Isabel chegou às cinco com o viático e teve que esperar mais de quinze minutos para que a moribunda saísse do banho. Quando a viu aparecer com uma camisola de morim e o cabelo solto nas costas, o décrepito pároco pensou que fosse uma brincadeira e despachou o coroinha. Pensou, entretanto, em aproveitar a ocasião para confessar Amaranta depois de quase vinte anos de reticência. Amaranta respondeu, simplesmente, que não precisava de assistência espiritual de nenhuma espécie porque tinha a consciência limpa (...). Então Amaranta se deitou e obrigou Úrsula a dar testemunho público da sua virgindade. – Que ninguém tenha ilusões – gritou, para que a ouvisse Fernanda. – Amaranta Buendia se vai deste mundo assim como veio.
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Fernanda del Carpio
Larissa Nakamura
Vivia com seu pai em uma cidade lúgubre e distante de Macondo. Cria desde cedo na riqueza da família, apesar de todos os indícios apontarem o contrário. Através de uma visão e confirmação da mãe, soube que um dia seria rainha. Fora educada a acreditar que era diferente da outras moças, pois seria membro da realeza. Seus pais a educaram de modo bastante peculiar: faziam loucuras para arcar com as despesas do enxoval de casamento, Fernanda não conhecia o mundo fora da cidade, fazia suas necessidade fisiológicas em um penico de ouro, não realizava trabalhos domésticos, desconhecia notícias vindas de outras partes do mundo e não possuía amizades. Estudou muitos anos em um convento, no qual todos aprovavam seu futuro: “...porque já era na época a donzela mais bela, distinta e discreta que tinham visto na vida.”.
Conhece Aureliano Segundo durante um carnaval em Macondo, no qual é proclamada rainha de beleza, assim como Remédios, a bela. Alguns dias após o festival, casa-se com Aureliano Segundo, em uma cerimônia ruidosa, marcada por grandes divertimentos.
Fernanda sofre bastante ao longo do seu casamento, devido à traição de seu esposo com Petra Cotes. Ainda no início da sua união, descobre a relação deles e resolve fugir, mas é persuadida a permanecer sob súplicas e promessas de Aureliano Segundo. Apesar disso, os votos são quebrados e seu marido permanece com sua amante, de tempos e tempos.
Fernanda del Carpio é uma mulher dura, conservadora, religiosa, cheia de pudores e formalidades que acabaram por criar problemas na sua incorporação familiar: “Em vão Úrsula insistiu para que ela tirasse a gola de lã com que se levantava quando tinha feito amor e que provocava os cochichos dos vizinhos. Não conseguiu convencê-la a se utilizar do banheiro, ou do vaso noturno, e a vender o seu peniquinho de ouro ao Coronel Aureliano Buendía para que o transformasse em peixinhos. Amaranta se sentiu tão incomodada com a sua dicção viciosa e com o seu hábito de usar um eufemismo para designar cada coisa, que diante dela sempre falava na língua do p.”.
Passa a dirigir a casa quando decide impor os hábitos de seus familiares com os Buendia: “Acabou com o costume de comer na cozinha e quando cada um tinha fome, e impôs a obrigação de o fazer em horas certas, na mesa grande da saia de jantar arrumada com toalhas de linho e com os candelabros e a baixela de prata.”, além de romper com o negócio de doces de caramelo de Úrsula. A partir da entrada da personagem no livro, se inicia a decadência dos Buendia e de Macondo: “Pouco a pouco, o esplendor funerário da antiga e gelada mansão foi se trasladando para a luminosa casa dos Buendia.”.
Renata Remédios “Meme”, Amaranta Úrsula e José Arcádio são os filhos da união de Fernanda com Aureliano Segundo.
Amaranta Úrsula é enviada Europa e volta casada com Gastón, homem muito rico.
José Arcádio é enviado à Roma para tornar-se padre. Fernanda espera ansiosamente seu retorno, todavia morre poucos meses antes de poder revê-lo.
Um dia, acreditando na existência de uma ladrão de galinhas, Fernanda comanda ao guarda a proteção do quintal durante a noite. Por um engano, o guarda põe fim ao relacionamento entre Meme e Maurício Babilônia quando atira no rapaz, tornando-o inválido. Poucos meses depois, nasce o seu neto, Aureliano Babilônia. Teria preferido ignorar a criança, porém: “Teve que suportá-la contra a vontade pelo resto da vida, porque na hora da verdade faltou a coragem para cumprir a íntima determinação de afogá-la na caixa-d’água do banheiro. Trancou-a na antiga oficina do Coronel Aureliano Buendía. A Santa Sofía de la Piedad conseguiu convencer de que o havia encontrado flutuando numa cestinha.”. Convive com o neto até sua morte.
Crendo que estava doente, trava uma longa correspondência secreta com os médicos invisíveis, que fracassam em ajudá-la: “Mas antes de que cumprisse o repouso prescrito recebeu uma carta desconcertada dos médicos invisíveis, que diziam tê-la revistado durante seis horas sem encontrar nada que correspondesse aos sintomas tantas vezes e tão escrupulosamente descritos por ela. Na realidade, o seu hábito pernicioso de não chamar as coisas pelo nome tinha dado origem a uma nova confusão, pois a única coisa que os cirurgiões telepáticos encontraram foi um caimento de útero que podia ser corrigido com o uso de um pesário.”.
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Pietro Crespi
Paula Oliveira
Pietro Crespi, é um tímido músico, italiano, que se torna centro de um triângulo amoroso entre Rebeca e Amaranta. Uma das descrições feitas sobre o jovem é a de um príncipe encantado (segundo os padrões eurocêntricos):
"Pietro Crespi era jovem e louro, o homem mais belo e mais bem-educado que Macondo jamais tinha visto, trabalhava com o colete de brocado e o grosso paletó de veludo escuro." (p. 101)
A primeira escolhida por Pietro Crespi foi Rebeca, porém Amaranta ao consegui adiar o casamento por anos, deixou uma grande brecha para que Rebeca se apaixonasse por José Arcádio. E assim ocorre mais uma história paralela. Mantendo-se próximo à família Buendía, Pietro Crespi, apaixona-se por Amaranta.
[...]Amaranta o recebia com carinhosa diligência. Adivinhava seus gostos, arrancava os fios descosturados dos punhos das suas camisas, e bordou uma dúzia de lenços com suas iniciais para o dia do seu aniversário. Ás terças-feiras, depois do almoço, enquanto ela bordava na varanda, ele lhe fazia alegre companhia. Para Pietro Crespi, aquela mulher que sempre considerou e tratou como uma menina foi uma revelação[...]. (p. 135)
Numa terça-feira finalmente, Pietro, pediu Amaranta em casamento, mas Amaranta adia-o. No fim, Pietro é rejeitado e nenhuma de suas súplicas (cartas de amor e serenatas) faz com a noiva mude de posicionamento.
"Passava o dia nos fundos da loja, escrevendo desatinadas cartas de amor, que fazia chegar a Amaranta com membranas de pétalas e borboletas dissecadas, e que ela devolvia sem abrir.Trancava-se horas e horas para tocar cítara." (p.150)
O final trágico sela uma história com um padrão romântico, através da belíssima descrição de García Márquez que transformou a morte numa poesia sublime digna do personagem;
[...] Certa noite, cantou. Macondo despertou numa espécie de estupor, angelizado por uma cítara que não merecia ser deste mundo e uma voz que não era possível conceber que houvesse outra na terra com tanto amor. Pietro Crespi viu então luz em todas as janelas do povoado, menos na de Amaranta. No dia 2 de novembro, dia dos mortos, seu irmão abriu a loja e encontrou todas as lâmpadas acesas e todas as caixinhas de música abertas e tocando todos os relógios travados numa hora interminável, e no meio daquele concerto disparatado encontrou Pietro Crespi na escrivaninha que ficava nos fundos, com os pulsos cortados, a navalha e as duas mãos metidas numa bacia de benjoin. (p. 150)
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Remédios, A Bela
Cassandra Carvalho
No livro de Gabriel Garcia Márquez, “Cem anos de solidão”, entre tantos personagens emblemáticos, encontra-se mais uma que chama muita atenção do leitor, o seu nome é Remédios, mais conhecida como Remédios, A Bela, outra herdeira da família dos Buendía, filha da Santa Sofia de La Piedad e Arcádio. Como o adjetivo dado a ela sugere, a garota é de uma beleza estonteante, motivo pelo qual atrai o olhar de todos, sobretudo dos homens que quando lhe veem ficam enfeitiçados diante de um ser tão gracioso.
Remédios, a Bela é uma garota diferente da maioria das outras de sua idade, cresceu sem malícias ou pensamentos complexos. Não tinha pretensões matrimoniais como as outras meninas. Viver, comer e dormir eram as únicas coisas que lhe interessavam. A vida para ela era algo muito simples, não colocava complicações em nada e não entendia porque as outras pessoas complicavam tanto. Para a personagem, andar nua era algo muito natural e achava graça dos homens que enlouquecidos por sua beleza, te pediam em casamento. Nas palavras do autor: “O assombroso do seu instinto simplificador era que quanto mais se desembaraçava da moda procurando a comodidade e quanto mais passava por cima dos convencionalismos em obediência à espontaneidade, mais perturbadora ficava sua beleza inacreditável e mais provocante o seu comportamento para com os homens.” (págs 222-23)
Ela não tinha a mesma sabedoria feminina da primeira personagem de mesmo nome e a sua “ingenuidade” chegava a ser inadequada de tão perturbadora. Algumas pessoas acreditavam que Remédios, a bela possuía poderes fatais e ainda que muitos homens chegassem a dizer que seriam capazes de sacrificar suas vidas para terem a chance de passar uma noite com uma mulher tão sedutora, nenhum deles se atreveu a de fato tentar casar-se com ela. Vivia sobre os cuidados extremos de Úrsula até que o último José Arcádio nasceu, tomando todas as preocupações da matriarca. Esta abriu mãos de seus cuidados com a garota, julgando que logo aconteceria um milagre e finalmente algum homem se disporia a se encarregar dos cuidados com ela. Todos que tentaram torná-la uma pessoa útil desistiram, pois não enxergam nela a possibilidade de transformação e assim a “abandonaram-na” e mais do que nunca ela refugiou-se na sua solidão e nos seus silêncios.
Enfim, chegou o dia em que esta figura quase mitológica, despede-se do mundo de uma maneira tão surpreendente quanto ela mesma. Foi quando numa tarde de março, na presença das mulheres de sua casa, após um misterioso sopro de ventos, Remédios, a Bela começa a levitar, dizendo adeus com as mãos e se perdendo no ar. Algo que criou especulações em muitos moradores que desacreditavam do fato narrado pela família, mas por outro lado, houve uma enorme comoção entre outros que viam no acontecimento um milagre e com isso muitas pessoas acenderam velas e rezaram novenas em sua intenção. E foi assim, que durante muito tempo, não se falou mais em outra coisa senão no prodígio de seu desaparecimento.
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Renata, Meme
Priscila Machado
Renata – “Meme”, filha de Aureliano segundo e Fernanda, era muito inteligente e dedicada. Terminou os estudos que a credenciava como concertista de clavicórdio e costumava executar temas do século XVII. Sempre demonstrava uma personalidade inconsistente, infantil e ao mesmo tempo combinava um grande talento para a arte. O clavicórdio sempre lhe acrescentava esse tom adulto, maduro. Fernanda, mãe de Renata, sempre pesava em Meme uma moral, um cuidado, impondo-a a obrigação de sempre apresentar-se frente aos outros, situação não muito agradável para Meme.
“A sua felicidade estava no outro extremo da disciplina, nas festas ruidosas, nos fuxicos de namoro, em trancar-se prolongadamente com as amigas em cantos onde aprendiam a fumar e conversavam de assuntos de homem, e onde uma vez passaram a mão em três garrafas de rum e acabaram nuas, medindo e comparando as partes do corpo.” (p.241)
Fernanda, com seu cuidado cego e sua disciplina dura, buscava ofuscar os reais desejos da filha. Aureliano segundo tinha uma relação de amizade com a filha, levando-a ao cinema e ao circo. Petra cotes, concubina de Aureliano Segundo, morria de medo que Meme conseguisse o que Fernanda nunca conseguiu – privá-la do amor de Aureliano. Meme não era tão bela, mas se caracterizava por sua simpatia e pela boa impressão que causava desde o primeiro momento, e, como bem descreve o autor: “ Tinha um espírito moderno que feria a antiquada sobriedade e o mal dissimulado coração avaro de Fernanda e que, pelo contrário, Aureliano segundo sentia o prazer em patrocinar” (p.242)
Nessas saídas com o pai, Meme conhece seu grande amor, “Mauricio Babilonia. Tinha nascido e crescido em Macondo e era aprendiz de mecânico nas oficinas de companhia bananeira. Meme o conhecera por acaso, numa tarde em que fora com Patricia Brown buscar o automóvel para dar um passeio pelas plantações.”(p.253) Despois disso, os encontros entre Meme e Mauricio eram frequentes e Fernanda não demonstrava alegria com a possibilidade deste paixão e dizia: “É um homem muito esquisito – Esta escrito na testa que vai morrer. (p.255). Meme ficou cada vez mais envolvida por ele, perdeu o sono, o apetite e buscava a todo momento despistar a mãe para encontra-lo. Fernanda, ao descobrir esses encontros, passou a aprisiona-la em casa.
A citação abaixo plasma a imagem do ápice do romance entre Meme e Mauricio Babilonia: “ Todas as noites, ao sair do banheiro, Meme encontrava Fernanda desesperada, matando borboletas com a bomba de inseticida. “Isto é uma desgraça”, dizia. “Toda a vida me disseram que as borboletas noturnas chamam azar.” Certa noite, enquanto Meme estava no banheiro, Fernanda entrou no seu quarto por acaso e haviam tantas borboletas que mal podia respirar. Apanhou um pano qualquer para espanta-las e seu coração gelou de pavor ao relacionar os banhos noturnos da filha com os cataplasmas de mostarda que rolaram pelo chão .Não esperou por um momento oportuno, como fizera da primeira vez. No dia seguinte, convidou para almoçar o novo alcaide que, como ela, tinha decido do Páramo, e pediu a ele que ordenasse uma guarda noturna para o quintal, porque tinha a impressão de que estava roubando as galinhas. Nessa noite, a guarda abateu Mauricio Babilonia quando levantava as telhas para entrar no banheiro onde Meme o esperava, nua e tremendo de amor, entre os escorpiões e as borboletas, como havia feito quase todas as noites dos últimos meses. Um projétil incrustado na coluna vertebral reduzi-o a cama pelo resto da vida. Morreu de velho na solidão, sem uma queixa, sem um protesto, sem uma só tentativa de deslealdade, atormentado pelas lembranças e pelas borboletas amarelas que não lhe concederam um instante de paz e publicamente repudiado como ladrão de galinhas.”
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