Apresentação de trabalho acadêmico: entre o prazer e a agonia

                                                               Por José Nilton Júnior


  Começa assim: mãos suando frio, estômago revolto, olhos perdidos em meio a uma plateia desconhecida com um ar de inquisição. A incerteza de um bom desempenho provoca uma sensação mórbida antecipada e evoca calafrios do ego, alterego, superego... Os instantes que separam o apresentador do momento crucial são simplesmente intimidadores.Daí, vem à memória as horas sofridas de pesquisa, o levantamento bibliográfico, a minúcia das citações, os debates com o orientador, um vislumbre do seu futuro acadêmico e outros delírios que reforçam o nervosismo.  

  O coordenador da mesa diz: " agora, ouviremos Fulano de Tal, com o trabalho X ect." Resta você e toda a sua trajetória até ali enquanto um pesquisador. Não deveria haver o que temer, afinal, aquilo é algo que está na ordem do seu dia. Um tema constantemente presente em sua vida acadêmica( e por que não extra-acadêmica?). A voz sai trêmula, o pensamento meio desordenado, um cuidado colossal para dizer coisa-com-coisa, algo que, de fato, comunique. A tensão ainda muito presente.

Digo que a plateia é o termômetro da sua performance: expressões faciais amigáveis, olhares curiosos, risos de canto de boca, concentração inquebrantável e, por dentro, você começa a sentir coragem de gritar pro mundo sem medo que aquilo que você está dizendo é importante e faz sentido. Um outro tipo de sentimento  dá lugar à agonia, mas ainda não é o prazer. É uma mescla de segurança, conforto, músculos relaxados, a voz não está mais trêmula, os olhos já conseguem encarar atrevidamente os desconhecidos que estão ávidos à espera de um clímax provocante. Mas isso já nem é problema. O desafio motiva e te deixa ainda mais confiante.

  Quando a desenvoltura se intensifica, o coordenador da mesa provavelmente já lhe apontou " 5 minutos". Aí é fogo: aquele nervosismo do início ameaça o retorno e tudo parece vertiginosamente rápido. Respira fundo, mais fundo. Seleciona, numa fração milionésima de segundos, as ideias mais importantes das trocentas que você realmente gostaria de dizer. Eufórico, afobado, aturdido conclui a apresentação. Percebe que a plateia entendeu o recado cruelmente forçado a ser dado em 15 minutos. Os aplausos não mornos, refletem o reconhecimento de uma apresentação entre razoável e boa. No debate, posterior a apresentação, elogios e alguns questionamentos. Valeu a pena. Os amigos enchem a bola: "foi bem, muito bem". Você quer acreditar e acredita, afinal, no íntimo você mesmo sabe que pode até não ter sido fantástico, mas não passou vergonha. Um alívio, comemoração, abraços, sorriso. Agora sim, é prazer.

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